O Santos FC estava em um momento de transição, os torcedores alvinegros não gritavam “É Campeão” há mais de 18 anos. As esperanças eram pequenas para uma conquista de expressão em curto espaço de tempo, devido a nossa estrutura, até então arcaica, e pela qualidade técnica da equipe no Departamento de Futebol. Em síntese, esta era a situação do clube quando assumimos a presidência em Janeiro de 2000, momento que ingressávamos no novo milênio, que representava a modernização e a evolução nas áreas de nossa sociedade. Por maior esperança dos santistas, dificilmente quem conhece e vivencia a história do Alvinegro Praiano poderia imaginar tamanha mudança de seu destino. Deus reservou momentos especiais aos santistas nesta nova década de glórias, de respeito ao seu passado, de títulos expressivos, da reconquista da autoestima do torcedor santista, principalmente os mais veteranos, acostumados com a década de 60, que na verdade começou em 1955, quando um verdadeiro esquadrão foi formado na Vila Belmiro para reinar e dignificar o futebol brasileiro.
Para os mais saudosistas e para as torcidas adversárias, o Santos FC vivia do seu passado. Éramos as “Viúvas do Pelé”, por sinal com muito orgulho e satisfação, mas gritavam também: “Pelé parou, o Santos acabou”. Incomodava, porque, não conquistávamos nada! Ou muito pouco, perto das exigências dos mais fanáticos!
Fomos à luta, liderei, com o meu vice Norberto Moreira, uma bela equipe de alvinegros dispostos a mudar esta péssima rotina. Dávamos sinais de recuperação, em menos de quatro meses do início da gestão, disputamos a primeira final de Paulistão, contra o São Paulo, no Morumbi, após eliminar o fortíssimo Palmeiras, de Felipe Scolari, em uma semifinal fantástica levando nossa sofrida torcida ao delírio e até para desfile na Praça da Independência! Isso mesmo, fomos à Praça da Independência, afinal não disputávamos uma final de Campeonato Paulista desde 1984!
Ao menos, começamos a atrapalhar e chegar mais próximos do sonhado título, já que anteriormente, crianças, adolescentes e jovens nem que sequer podiam dizer de suas preferências e ídolos nas salas de aulas, porque eram engolidos pelos torcedores do Trio de Ferro da Capital Paulista, que gozavam e humilhavam contando suas recentes e expressivas conquistas.
No ano seguinte, nova frustração, desta vez, tomamos o gol da virada no Paulista de 2001, jogando por um simples empate por ter tido melhor campanha na fase preliminar que o Corinthians até chegar nas semifinais.
Mas, chegou 2002! Tivemos um péssimo 1º semestre, ficamos aproximadamente quatro meses sem entrar em campo com a desclassificação do Torneio Rio/São Paulo e pelo calendário que previa recesso devido a Copa do Mundo. Quanto desespero! Sem jogos, sem patrocínios, sem atividades, sem amistosos, porém com tempo suficiente para preparar uma grande equipe, parte dela que foi contratada durante os dois anos de Administração que fariam parte do futuro plantel. Será que já havia chegado o momento de efetivar as jovens promessas? Em um momento tão conturbado, com tantas exigências, os Meninos da Vila poderiam assumir esta responsabilidade? De fato, Renato, Elano, André, Alex, Fabio Costa, Leo, Paulo Almeida, entre outros, já estavam no Profissional há algum tempo. Diego e Robinho, das equipes de Base, chegaram um pouco depois e foram lançados pelo técnico Celso Roth, que saiu do clube por não aceitar as propostas salarial e de renovação no elenco naquele instante.
Elano comemora o título |
O Leão e sua atuante Comissão Técnica trabalharam muito, com toda a sua capacidade e competência, sabendo que aquela poderia ser uma das últimas oportunidades de trabalhar em uma grande equipe e reconquistar seu prestígio e imagem de vitorioso.
Fizemos alguns amistosos pelo interior de São Paulo e um jogo beneficente contra o Corinthians, na Vila Belmiro, arrecadando alimentos para entidades assistenciais. Confesso, fui ao reservado da Diretoria com toda a preocupação de após meses sem jogar partidas oficiais, ter de enfrentar um importante e tradicional adversário. Puro engano! O Santos mostrou a sua força, a sua classe, a técnica refinada, a garra e a determinação de uma equipe amadurecida pelo tempo e pelo trabalho. Ganhamos por 3x1, se não bastasse a vitória e a bela apresentação, mostramos um Santos diferente, um grupo preparado para assumir a responsabilidade de tirar o clube da “fila”! Um verdadeiro show, com direito a toques de classe, “chapéu”, gol de letra, arrancando aplausos, suspiros e alegria de uma sofrida torcida. Para surpresa, até os ânimos ficaram exaltados, fazendo com que jogadores corinthianos quisessem intimidar a classe dos mandantes do jogo, apelando para a violência contra os nossos Meninos. Será que já imaginavam que no futuro poderíamos nos confrontar em jogos tão decisivos para a história?
Robinho e Diego |
Começamos o Brasileiro, nossas torcidas organizadas compareciam aos estádios com suas faixas de cabeça para baixo, um protesto contra a ausência de títulos, talvez também prevendo que se não alcançássemos em nossa gestão, dificilmente encontraríamos o caminho dos títulos. Puro engano, não por causa de suas expectativas e esperanças em nosso trabalho, mas que o Senhor dos Exércitos, Criador do Céu e da Terra, já havia escrito e determinado a sua vontade perante as decisões na Terra.
Nos jogos iniciais, até os adversários conhecerem nossa equipe, nosso sistema de jogo, demos espetáculos, até o confronto contra o próprio Corinthians, no Pacaembu. Novo show, 4x0 no 1º tempo, com gol de bicicleta de Alberto. Maravilhoso!!!
O time se classificou com dificuldade para as finais, porém cresceu nos momentos decisivos, vencendo o favorito São Paulo nos dois jogos das oitavas-de-finais, que possuía a melhor campanha do campeonato, o temido Grêmio na semi-final e chegando ao último jogo com a vantagem sobre o Corinthians do técnico Parreira, campeão do Rio-São Paulo e da Copa do Brasil naquele ano, revertida na primeira partida.
A torcida, que mantinha as suas faixas e o escudo do clube de cabeça para baixo, dividiu o Morumbi confiando naqueles Meninos que demonstravam amor e luta, dispostos a encerrar o incômodo jejum de conquistas expressivas.
Como bem dizia o técnico Emerson Leão, “era a última música do baile, onde entramos adquirindo o último convite e com dançarinos muito habilidosos, mas de fato pouco experientes”.
Tenho na memória todos os lances daqueles 90 minutos que mudaram a vida do Santos FC. Aos 37 minutos do 1º tempo, um menino franzino, pediu a bola, colocou-a embaixo de seus braços, bateu o pênalti com a coragem e precisão dos verdadeiros ídolos. Metade do Morumbi veio abaixo, aliás em todo o Brasil, santistas e admiradores do futebol arte, que queriam ver o atrevimento daqueles Meninos, faziam questão de parar o que faziam, para se dirigirem as telas de televisões ou aos estádios, para se divertirem e aplaudirem o verdadeiro futebol, da ginga, do improviso, da técnica, da arte, de momentos mágicos dos artistas da bola!
Robinho e as famosas sete pedaladas |
E o gol do Léo, após a entortada de Robinho na defesa corintiana? Alguém consegue imaginar um final melhor do que esse? Santos, Campeão Brasileiro pela primeira vez nesta nova fórmula da competição desde 1970, graças a competência de um excelente elenco muito bem dirigido pelo Emerson Leão.
Posso afirmar, sem dúvida alguma, que este título de 2002 é o mais importante e significativo de todos que o Santos conquistou em nossa última gestão no clube, talvez até dentre todos desta década. E não apenas pela conquista em si, mas pelo seu legado, que marcou uma virada no clube, o ressurgimento de um leão adormecido, do Rei da Selva, ou melhor, a velha Baleia, a Rainha do Mar! Após 2002, fomos mais respeitados, aumentamos a força da torcida, que resgatou a sua auto-estima e confiança, rejuvenescendo nossos torcedores, recuperando crianças, adolescentes e jovens, foi possível estruturar o clube para o novo milênio e colocá-lo no caminho das disputas
Marcelo Teixeira e o troféu do Brasileiro de 2002 |
* Marcelo Teixeira é conselheiro nato e ex-presidente do Santos FC. Além do Brasileiro de 2002, o Santos FC conquistou em sua gestão os seguintes títulos: Campeão Brasileiro de 2004 e Bicampeão Santista de 2006/2007
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